Editorial do Globo aponta falhas na proposta de regulamentação das apostas esportivas
A regulamentação das apostas esportivas no Brasil continua sendo amplamente debatida na sociedade e gerando uma grande disparidade de opiniões. Recentemente, temos compartilhado aqui na Casa do Apostador alguns editoriais de renomados jornais do país que expressam opiniões contundentes sobre as propostas do governo para regular essa atividade. Nesta semana, o jornal O Globo também divulgou um editorial destacando algumas deficiências do projeto que visa regulamentar as apostas esportivas no Brasil.
Uma das principais preocupações expressadas pelo jornal O Globo em seu editorial, publicado na última segunda-feira, 22 de maio, está relacionada com a ideia do governo em deixar a responsabilidade de controlar o fluxo financeiro das apostas esportivas nas mãos de uma pequena secretária do Ministério da Fazenda, que nem sequer existe. De acordo com o jornal, a pasta não teria a estrutura necessária para essa atividade, que deve movimentar bilhões de reais. O jornal também mostra muita preocupação com a ganância tributária do governo, que parece se atropelar com a própria sede de arrecadar recursos.
Confira abaixo, na íntegra, o editorial do jornal O Globo que foi publicado nesta semana:
Regulação de apostas esportivas transcende a questão tributária
O escândalo da manipulação de resultados no futebol demonstra a urgência de regular e fiscalizar sites e casas de apostas. A CPI das Apostas no Congresso promete trazer propostas para isso. A intenção do governo, já expressa, é criar uma secretaria no Ministério da Fazenda para certificar esses ambientes, além de acompanhar o volume de dinheiro movimentado e a arrecadação de impostos. Mas é duvidoso que essa seja a melhor estratégia para o país.
Permitidas a partir de 2018, as apostas movimentam, pelas estimativas do próprio governo, entre R$ 120 bilhões e R$ 150 bilhões (para ter uma base de comparação, as loterias da Caixa Econômica faturaram R$ 23 bilhões em 2022). De acordo com algumas estimativas, já operam algo como mil sites para apostar em partidas de futebol, cujos servidores e sedes ficam longe do alcance da Receita Federal. Não é à toa que o governo esteja de olho na dinheirama que passa ao largo de qualquer fiscalização.
Mas a visão meramente fiscalista da regulamentação das apostas on-line seria um erro. Criar um apêndice da Receita Federal no Ministério da Fazenda não basta para dar conta do desafio regulatório. A pasta é historicamente voltada para garantir a arrecadação e formular políticas econômicas. Não tem a cultura adequada para abrigar em sua estrutura um órgão destinado a lidar não apenas com as máfias tentando burlar regras para ganhar dinheiro fácil, mas com um universo que mistura saúde, tecnologia digital e esportes.
O governo poderá até ficar satisfeito com a receita tributária dos jogos, e mesmo assim o futebol brasileiro continuar a perder credibilidade. Qualquer lance duvidoso alimenta discussões intermináveis. Se a fiscalização das casas de apostas não garantir que sejam confiáveis, haverá dúvida sobre a manipulação do resultado dos jogos. Torcedores se afastarão de estádios e transmissões, e o futebol brasileiro entrará numa crise inédita.
É necessário cercar a questão por todos os lados. A regulação precisa estabelecer controles para identificar contas com movimentações atípicas, que possam estar relacionadas a apostas em partidas fraudadas. De acordo com o advogado Pedro Simões, do escritório Duarte Garcia, Serra Netto e Terra, o Coaf, organismo que monitora transações financeiras, seria indicado para atuar nesse campo. Ele sugere ainda um valor máximo para as apostas mais sujeitas a fraude, como número de cartões ou pênaltis numa partida.
Há quem defenda uma agência específica, com a participação de Polícia Federal, Ministério Público, CBF e clubes. Na Espanha e na Alemanha, jogadores podem denunciar tentativas de aliciamento ou qualquer movimento suspeito em torno de um jogo, sob absoluto sigilo, por meio de um aplicativo. O importante é governo, CBF e clubes entenderem que no mundo das apostas no futebol e em qualquer outro jogo não se pode deixar brecha para a fraude, porque a credibilidade é o maior ativo do esporte.
Ninguém entende
Se formos fazer um grande apanhado dos últimos editoriais que os grandes veículos de comunicação do país fizeram sobre o projeto de regulamentação das apostas esportivas proposto pelo governo, chegaremos facilmente à conclusão de que há muitas dúvidas quanto ao futuro dessa proposta, visto que as falhas na construção do projeto são visíveis. A opinião sobre a necessidade de uma regulamentação desse setor, no entanto, segue sendo unânime, mas o projeto e as suas características se mostram de grande fragilidade.
Apressado, com enfoque errado, cheio de projeções supervalorizadas e talhado dentro de uma ideia abusiva de taxações, o projeto de regulamentação das apostas esportivas que tem sido conduzido pelo governo brasileiro tem absolutamente tudo para dar errado. Confesso que ficarei muito surpreso com qualquer outro resultado que não seja esse. Do jeito que está, sem sofrer grandes alterações e adequações à realidade, provavelmente o mercado regulado das apostas esportivas no Brasil será um enorme fracasso.
Isso não significa que uma possível regulamentação das apostas esportivas no Brasil, seguindo este modelo proposto pelo governo, será inútil. Há pontos no projeto que podem funcionar e certamente tornarão a atividade no país um pouco mais segura. Contudo, esses detalhes, que poderiam se unir a um projeto de regulamentação eficiente, não são suficientes para sustentar a base da ideia, que basicamente é sugar tudo de bom que for possível do mercado, sem nenhuma contraproposta, o deixando somente sobreviver com as sobras.
As críticas do editorial publicado pelo jornal O Globo são pertinentes. Como já estamos cansados de afirmar aqui na Casa do Apostador, a ganância do governo e a pressa para cobrir rombos financeiros com uma arrecadação de impostos abusiva do mercado das apostas esportivas deve fazer com que esse projeto se arruine e, com ele, carregue para a lama o futuro de diversas pessoas e empresas que, com apoio, poderiam transformar o Brasil em uma potência internacional dos jogos. Não tem como criar uma regulamentação das apostas nas coxas e esperar que ela funcione. É a mesma lógica de acreditar que um puxadinho no Ministério da Fazenda será o suficiente para controlar o fluxo financeiro deste mercado. Ninguém entende o que está acontecendo no Brasil.
Escrito por Sérgio Ricardo Jr