Ministério da Fazenda estuda domínio exclusivo para casas de apostas licenciadas
O Ministério da Fazenda está avançando nos últimos detalhes sobre a regulamentação do setor de apostas esportivas online no Brasil. Nas últimas semanas, a pasta tem debatido a implementação de um domínio específico na internet, o “.bet”, que seria reservado exclusivamente para empresas autorizadas. Esta iniciativa, concebida para fortalecer a fiscalização e garantir a legalidade das operações, visa facilitar a identificação das plataformas regulamentadas, protegendo os usuários de possíveis fraudes.
Enquanto o debate sobre a gestão desse domínio ainda está em curso, a arrecadação potencial do setor, estimada em bilhões, e os interesses políticos em jogo têm alimentado a discussão. A saída de alguns nomes importantes na articulação do projeto ainda levanta questionamentos sobre os rumos dessa regulamentação, enquanto o presidente Lula expressa preocupações sobre os impactos das apostas online na sociedade brasileira.
Confira abaixo, na íntegra, uma matéria da Folha de SP a respeito do assunto:
Governo debate uso de domínio ‘.bet’ em sites de apostas esportivas
Fazenda trabalha na regulamentação do setor e na criação de mecanismos de fiscalização
O Ministério da Fazenda pretende criar uma extensão própria para os sites de casas de apostas esportivas e cassinos online no Brasil. A intenção é que seja aberto o domínio “.bet”, que servirá exclusivamente para as empresas do setor e ficará antes do “.br” nas url(”), órgão do Comitê Gestor da Internet no Brasil responsável por criar domínios no país.
Se a ideia for levada adiante, como pretende a equipe do Ministério da Fazenda, apenas as casas de aposta autorizadas a funcionar deverão utilizar a extensão “.bet”.
A iniciativa visa facilitar a identificação das plataformas que atuam dentro da lei e dificultar a ação de empresas em situação irregular.
O domínio específico poderá ajudar o próprio usuário a saber quais são as empresas autorizadas a funcionar no Brasil e evitar que apostadores caiam em golpes ou fraudes, bem como agilizar a fiscalização e o monitoramento de possíveis irregularidades.
Ainda é necessário definir, por exemplo, quem fará a gestão do domínio, ou seja, quem será responsável por autorizar ou não determinados sites e dizer quais endereços são de empresas regulares e poderão ser liberados.
Segundo pessoas envolvidas nas conversas, o procedimento não deve enfrentar problemas, mas há também quem defenda, na Fazenda, o uso de “apostas” em vez de “bet”.
Ainda não está definido quem será responsável por gerenciar as casas de aposta online que atuarão no Brasil nem como funcionará, na prática, a fiscalização do setor.
Até o momento, a expectativa é que boa parte dessas atribuições recaia sobre o próprio Ministério da Fazenda e sobre a Secretaria de Prêmios e Apostas, criada recentemente para centralizar essas funções.
Ao mesmo tempo, devem ser criados fluxos de trabalho em parceria com outros ministérios, como a Justiça, o Esporte e a Saúde e órgãos como a Receita Federal, que arrecadará os impostos.
A Secretaria de Prêmios e Apostas, no entanto, ainda não tem secretário.
José Francisco Manssur, que foi responsável pela elaboração do projeto do governo para regulamentar o setor e cuidou do assunto durante a tramitação da proposta no Congresso, era dado como certo para o cargo.
Após a aprovação do projeto, Manssur chegou a elaborar as primeiras portarias e minutas sobre a regulamentação de apostas esportivas e iniciou as tratativas com as empresas. O cotado para a secretaria, no entanto, deixou o governo após pressão do Centrão por influência no órgão.
O interesse do grupo liderado por Arthur Lira (PP-AL) está relacionado à enorme movimentação financeira potencial de apostas esportivas e cassinos online no país.
Projeções da Fazenda estimam entre R$ 3 bilhões e R$ 6 bilhões a arrecadação com o setor em 2024, por exemplo.
Quando Manssur deixou o governo, contudo, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, negou que a saída tenha ocorrido devido a pressão política.
“Não, de jeito nenhum. O Manssur esteve aqui para formatar o projeto das bets, e foi um processo muito bem encaminhado por ele. Ele é um profissional de altíssima qualidade. A pedido, vai enfrentar outros desafios. Mas não tem nada a ver com isso”, disse na ocasião.
Como mostrou a Folha na série Bets no Brasil, os brasileiros gastaram mais de R$ 50 bilhões em apostas durante 2023. Pesquisa Datafolha apontou que 15% da população brasileira diz apostar ou já ter apostado —em sua maioria, jovens.
O grande potencial econômico vem atraindo empresas gigantes, de todo o mundo, para atuar no país.
Entre aquelas que já manifestaram à Fazenda interesse em atuar no Brasil, mesmo antes de a regulamentação estar finalizada, estão Globo, Kwai e Caixa Econômica, além de cassinos de Las Vegas, empresas com sócios investigados ou de outros setores, como imobiliárias.
A lei das apostas esportivas online prevê uma alíquota de 12% sobre a arrecadação dos sites, descontado o pagamento dos prêmios. Já os apostadores devem pagar 15% do valor obtido com a premiação.
A norma classifica como apostas de alíquota fixa os eventos “reais de temática esportiva” e os “virtuais de jogos online” —dispositivo que inclui os games, ou esports, e abre brecha para jogos de azar em ambiente virtual.
No final de fevereiro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) criticou as apostas esportivas. “Pior do que o jogo do bicho hoje é que, 24 horas por dia, é jogo na televisão, o jogo digital”, disse Lula, fazendo referência às apostas online.
“Isso porque cassino é proibido aqui. Porque cassino é jogo do azar, jogo do bicho é jogo de não sei das quantas. Mas no jogo eletrônico, agora pode jogar criança de 5 anos de idade à pessoa de 90 anos. Não tem limite. A ordem é jogar.”
Fonte: Folha de SP