Senado deve definir situação da regulamentação dos jogos de azar ainda neste ano
O Senado Federal pode avançar na próxima semana na regulamentação dos jogos de azar no Brasil. A pauta deve ser votada no plenário na quarta-feira (4), conforme anunciou o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Caso não seja analisada nesse dia, a proposta poderá retornar à agenda no dia 10 de dezembro. O projeto, já aprovado na Câmara em 2022 e na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado em junho deste ano, propõe a legalização de modalidades como bingos, cassinos, jogo do bicho, apostas online e turfe.
A proposta estabelece um marco regulatório para essas atividades, que incluem critérios de licenciamento, fiscalização e tributação, além de políticas de proteção aos apostadores. Se aprovado, o texto revogará uma proibição em vigor desde 1946, tornando legal a exploração de jogos de azar no Brasil. A operação ficará restrita a empresas registradas no país, que deverão atender requisitos como capital mínimo, origem lícita de recursos e licença emitida pelo Ministério da Fazenda. As exigências variam conforme a modalidade: cassinos, por exemplo, precisam de um capital mínimo de R$ 100 milhões e funcionarão em complexos integrados de lazer ou embarcações. Já as licenças para bingos e jogo do bicho terão validade de 25 anos, com capital mínimo de R$ 10 milhões.
Além disso, o texto prevê uma tributação sobre ganhos de jogadores e receitas das empresas. Prêmios acima de R$ 10 mil serão taxados em 20% pelo Imposto de Renda, enquanto casas de apostas pagarão uma Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) de 17% sobre a receita líquida. A proposta também busca minimizar riscos associados aos jogos de azar, como compulsão e lavagem de dinheiro. Pessoas diagnosticadas com vício poderão solicitar inclusão no Registro Nacional de Proibidos (Renapro), que impede apostas em todas as modalidades.
Empresas terão de adotar sistemas de transparência, auditar suas operações regularmente e reportar movimentações financeiras ao Ministério da Fazenda em tempo real. Outras restrições incluem a proibição de empréstimos aos apostadores e o veto a menores de 18 anos, que também não poderão acessar locais autorizados para as apostas.
Embora tenha apoio do governo e de boa parte dos senadores, a proposta enfrenta resistência de setores conservadores e movimentos sociais. Parlamentares contrários ao projeto alertam para possíveis impactos sociais, como aumento do vício em jogos e endividamento de famílias. Por outro lado, defensores argumentam que a regulamentação transformará uma prática clandestina em atividade controlada, reduzindo o vínculo com o crime organizado e gerando receita para o país. Parte da arrecadação, segundo o texto, será destinada a programas de combate à dependência de jogos e a fundos estaduais e municipais.
Se o texto for aprovado no Senado sem alterações, seguirá para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A regulamentação deve entrar em vigor 12 meses após a publicação da lei, período necessário para que o Ministério da Fazenda elabore os critérios detalhados de licenciamento e operação. A expectativa é que a votação ocorra antes do recesso parlamentar, marcado para iniciar em 23 de dezembro.
Difícil acreditar
É difícil não olhar com ceticismo para o anúncio de que a regulamentação dos jogos de azar no Brasil pode finalmente sair do papel ainda este ano. Por mais que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, tenha definido datas para votação, o histórico desse projeto é marcado por promessas não cumpridas, debates adiados e inúmeras versões que nunca chegaram a um consenso definitivo. São décadas de espera, com o tema sendo retomado e engavetado sucessivamente, o que torna quase impossível acreditar que desta vez será diferente.
Não se pode negar que o texto atual é abrangente, abordando aspectos como fiscalização, tributação e políticas de proteção aos apostadores. No entanto, justamente por ser um projeto ambicioso e controverso, ele enfrenta barreiras de diversos lados, desde as críticas de setores conservadores até a resistência de parte da sociedade. A aprovação na Câmara em 2022 e o avanço na Comissão de Constituição e Justiça do Senado foram passos importantes, mas, como já vimos antes, isso não garante que o processo chegará ao fim antes da virada do ano.
Minha expectativa, sinceramente, é moderada. Não ficarei surpreso se os próximos dias trouxerem mais uma recalculagem de rota, seja por divergências entre os parlamentares ou pela pressão de grupos contrários. Adiar decisões sobre esse tema parece ter se tornado uma rotina, e seria ingênuo descartar essa possibilidade novamente. Por enquanto, resta acompanhar os desdobramentos no Senado e esperar para ver se, desta vez, os parlamentares terão a disposição necessária para quebrar esse ciclo de indefinições que há tanto tempo trava a regulamentação dos jogos de azar no país.