Governo suspende oferta de bônus e restringe publicidade do mercado de apostas
O Ministério da Justiça e Segurança Pública, em parceria com a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), anunciou nesta terça-feira (19) medidas rigorosas para regular a publicidade de sites de apostas no Brasil. A decisão, publicada no Diário Oficial da União, impõe a suspensão de propagandas voltadas para crianças e adolescentes, além de suspender a oferta de bônus e anúncios que incentivem práticas de consumo consideradas irresponsáveis.
De acordo com a Senacon, a ausência de regras claras sobre a divulgação de apostas tem exposto menores de idade ao risco de dependência e ao estímulo precoce ao jogo. Entre os casos mais críticos apontados pela nota técnica, destaca-se o uso de influenciadores mirins em campanhas publicitárias, algo que fere o Código de Defesa do Consumidor.
As novas determinações incluem ainda a proibição de “publicidades de recompensa” — práticas que oferecem benefícios, como bônus ou antecipações, em troca de ações específicas dos consumidores. A medida busca conter o impacto dessas promoções, que, segundo a Senacon, podem levar ao endividamento, especialmente entre pessoas sem condições financeiras adequadas.
De acordo com o órgão, as propagandas excessivas criam estímulos que podem induzir escolhas impulsivas, alimentadas por pressões sociais e a busca por pertencimento. Empresas que descumprirem as regras estarão sujeitas a multas diárias de R$ 50 mil até que as determinações sejam cumpridas integralmente. Além disso, as operadoras autorizadas a atuar no Brasil têm um prazo de 20 dias para implementar as mudanças e apresentar um relatório de transparência detalhando as ações realizadas.
Atualmente, 100 empresas possuem autorização para operar no país até o fim de 2024, sob supervisão da Secretaria de Prêmio e Apostas do Ministério da Fazenda. Para Igor Britto, diretor-executivo do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), as novas restrições representam um passo crucial na discussão sobre a regulamentação do setor de apostas. Ele ressalta o impacto da publicidade, não apenas em menores de idade, mas também em adultos vulneráveis.
“O impacto da publicidade em crianças e adolescentes é enorme, mas também é muito forte nos adultos, principalmente os mais vulneráveis, que veem na aposta uma forma de tentar melhorar de vida“, afirmou Britto em declaração publicada pelo G1. Além das medidas anunciadas, o governo reforçou a proibição de utilização de recursos de programas assistenciais, como o Bolsa Família e o Benefício de Prestação Continuada (BPC), em apostas online. A decisão havia sido previamente determinada pelo ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), que também exigiu a aplicação imediata de medidas de proteção especial ao público vulnerável.
Muda pouco
As medidas anunciadas pelo governo, embora importantes, levantam reflexões sobre seu impacto real no mercado de apostas e na experiência dos consumidores. É inegável que restringir a publicidade de apostas para crianças e adolescentes e proibir práticas abusivas são ações necessárias para proteger os mais vulneráveis. No entanto, vale questionar até que ponto essas regras atingirão seu objetivo principal, especialmente em um mercado onde grande parte das irregularidades é cometida por empresas que já operam à margem da lei.
A proibição do uso de influenciadores mirins, por exemplo, parece atingir um alvo inexistente no mercado regulamentado. Nenhuma empresa séria arriscaria associar sua imagem a práticas tão evidentemente inadequadas, tanto pela repercussão negativa quanto pelas penalidades legais. Esse tipo de abordagem é característico de operadores offshore, que ignoram qualquer norma e continuarão promovendo suas atividades de maneira clandestina, independente das restrições.
Já a suspensão dos bônus é um ponto mais delicado. Entende-se a preocupação do governo, dado que promoções mal reguladas podem, de fato, incentivar práticas irresponsáveis e endividamento. Contudo, os bônus também são uma das partes mais atrativas para o apostador. Ofertas como freebets, créditos promocionais e bônus por depósito não apenas tornam a experiência mais agradável, mas também representam benefícios legítimos para quem aposta de maneira responsável.
O problema é que as diretrizes anunciadas ainda deixam dúvidas: serão restrições para todos os tipos de bônus ou apenas para as práticas mais agressivas, como as bonificações vinculadas a adiantamentos ou condições complicadas? Sem uma definição clara, o que se observa é mais uma retirada de benefícios para os apostadores. Medidas assim podem acabar afastando jogadores do mercado legalizado, empurrando-os para operadores irregulares, que continuarão oferecendo bônus e promoções sem nenhum controle.