Folha de SP aponta dependência financeira dos clubes ao mercado de apostas
O domínio dos sites de apostas esportivas no mercado de patrocínios tem transformado o cenário do futebol brasileiro, impondo novas dinâmicas econômicas e gerando dependência financeira para os clubes. Pelo menos é isso que afirma o jornal Folha de SP, que recentemente publicou uma reportagem com levantamentos sobre a situação atual. Atualmente, 16 dos 20 times que disputarão a Série A do Campeonato Brasileiro em 2025 têm uma casa de apostas como principal parceira. Esse número deve crescer em breve, alcançando 90% das equipes, já que Grêmio e Internacional estão em negociação com empresas do setor.
A crescente presença das chamadas “bets” no mercado publicitário ficou evidente nos últimos anos. Em 2023, 11 clubes estampavam marcas de apostas em suas camisas. Esse número saltou para 14 em 2024, consolidando o segmento como a principal fonte de patrocínio no esporte. Apenas Bragantino (Red Bull) e Mirassol (Guaraná Poty) permanecem com empresas de outros setores como patrocinadores principais, de acordo com o levantamento da Folha.
No topo da lista dos contratos mais valiosos estão Flamengo (R$ 105 milhões, Pixbet), Corinthians (R$ 103 milhões, Esportes da Sorte) e Palmeiras (R$ 100 milhões, Sportingbet). A parceria do Palmeiras com a Sportingbet, que substituiu a histórica relação de dez anos com a Crefisa, é um exemplo claro do poder financeiro das apostas. O novo contrato renderá R$ 100 milhões fixos por temporada, corrigidos pela inflação, e pode alcançar R$ 170 milhões com bônus por desempenho.
Enquanto a maioria dos clubes viu os valores de seus contratos dispararem, o Corinthians foi uma exceção recente. O clube paulista reduziu seu contrato fixo de R$ 120 milhões com a VaideBet para R$ 103 milhões com a Esportes da Sorte, após romper o acordo anterior devido a investigações de suspeitas de irregularidades financeiras. Apesar disso, o montante atual representa um salto significativo em relação ao contrato de R$ 22 milhões anuais que o clube tinha até 2023 com a Hypera Pharma.
O Santos também protagonizou um crescimento expressivo, garantindo R$ 55 milhões anuais com a Blaze — um aumento de 358% em relação ao contrato anterior. No geral, os dez maiores contratos de patrocínio do país superam os R$ 42 milhões anuais, evidenciando a força do segmento. A regulamentação da atividade no Brasil, iniciada em 2023, impulsionou ainda mais a corrida das empresas do setor por licenças para operar. Para atuar de forma regular no país, cada empresa precisa desembolsar R$ 30 milhões, além de cumprir normas estabelecidas pela Secretaria de Prêmios e Apostas, vinculada ao Ministério da Fazenda.
Embora a dependência financeira dos clubes em relação às apostas esportivas gere preocupação, especialistas apontam aspectos positivos. “Quando a gente encontra um segmento privado com alto poder de investimento disposto a entender que o esporte é uma ótima ferramenta para atingir o seu público, temos que considerar isso como uma externalidade positiva”, afirmou José Francisco Manssur, especialista em direito esportivo, à Folha.
Inevitável casamento
A reportagem da Folha reforça uma percepção que já se desenhava há anos: a dominância das casas de apostas no futebol brasileiro é resultado natural de um cenário global. A regulamentação oficializada do mercado apenas acelerou um movimento que, na prática, já vinha acontecendo. Com poder aquisitivo massivo e uma estratégia agressiva de marketing, as empresas de apostas tomaram para si a linha de frente do mercado publicitário esportivo.
Não é exagero dizer que essa dominância já se traduz em dependência. Afinal, 16 dos 20 clubes da Série A do Campeonato Brasileiro para 2025 têm uma casa de apostas como parceira principal, e esse número tende a aumentar. A força financeira deste setor cria um abismo difícil de ser alcançado por empresas de outros ramos, que não têm a mesma disposição para brigar pelos espaços mais nobres das camisas dos clubes.
O poderio econômico das “bets” já supera, em muito, os antigos patrocinadores tradicionais, como bancos e empresas públicas. E a matemática é clara: enquanto os clubes precisarem de dinheiro para manter elencos competitivos e equilibrar suas contas, a busca por patrocinadores que ofereçam os maiores valores será inevitável. A questão que se coloca, então, não é se o futebol vai se tornar dependente desse segmento, mas até que ponto essa relação será sustentável e saudável.
Claro, é compreensível que ainda haja receio de parte do público. Muitos torcedores têm dúvidas sobre o impacto das apostas na integridade do esporte e veem a dependência financeira como um risco para os clubes. Contudo, precisamos lembrar que essa não é uma exclusividade brasileira. No cenário internacional, países com mercados regulamentados, como Inglaterra e Espanha, também viram o setor de apostas assumir protagonismo nas últimas décadas.
É um cenário complexo, sem dúvida, mas que também traz oportunidades. O investimento privado, quando bem regulamentado, pode ser um impulsionador para o crescimento dos clubes e do próprio esporte. Cabe aos gestores do futebol brasileiro encontrar o equilíbrio necessário para aproveitar os benefícios sem perder de vista os desafios éticos e financeiros que essa relação impõe. Afinal, o futebol é um jogo de paixão, mas também, inevitavelmente, um negócio.