Especialistas projetam queda nos valores de patrocínios pagos por casas de apostas
Em fase de crescimento acelerado no Brasil, o mercado de patrocínio esportivo por casas de apostas, que tem beneficiado clubes e campeonatos, pode sofrer grandes alterações nos próximos anos. Pelo menos é isso que projeta um artigo publicado pelo jornal O Globo nos últimos dias. Baseado na opinião de Fábio Wolff, sócio-diretor da Wolff Sports & Marketing, e Fernando Trevisan, diretor da Trevisan Escola de Negócios, o artigo publicado pelo jornal levantou a possibilidade dos números praticados atualmente pelo mercado diminuírem drasticamente nos próximos anos por conta da simples consolidação das marcas no país.
Atualmente, quase todos os times da Série A do Campeonato Brasileiro têm marcas de casas de apostas em suas camisas, e dos 60 clubes das três principais divisões nacionais, 51 são patrocinados por sites de apostas. No entanto, especialistas alertam para a formação de uma bolha mercadológica que está perto de estourar, levando as marcas a reduzirem os valores investidos. Além disso, a regulamentação do setor e algumas possíveis restrições semelhantes às impostas em outros países podem impactar o mercado de patrocínios, levando os clubes a buscar uma maior diversificação das suas atuais fontes de receita.
Confira abaixo, na íntegra, o artigo escrito por Fábio Wolff e Fernando Trevisan no jornal O Globo:
Valor de patrocínios de casas de apostas a clubes deve diminuir
Em ebulição e pagando a clubes cotas maiores do que os valores praticados no mercado, setor ainda verá crescimento com regulamentação, mas deve mudar estratégia após consolidação de marcas
As casas de apostas investiram e continuam a investir bastante dinheiro no mercado publicitário esportivo. Dos 20 times da Série A do Campeonato Brasileiro, 19 deles têm em suas camisas marcas de sites de jogos de azar. Abrangendo o escopo, dos 60 clubes que jogam as três primeiras divisões do campeonato nacional, 51 são patrocinados pelos sites. Os patrocínios não terminam por aí, há naming rights de competições, jogadores contratados como embaixadores, mídia esportiva, e por aí vai.
Levando em consideração apenas os times da Série A, segundo um levantamento realizado pela agência de marketing esportivo NeoBrand, dez casas investiram R$ 327 milhões nos clubes para divulgarem suas marcas em sete locais diferentes das camisas.
Dos patrocínios, 11 são máster, ou seja, o principal. O mercado, no momento, está aquecido, mas, segundo especialistas, está se criando uma bolha que em algum momento vai estourar. Porém, esse momento ainda não chegou.
O “estourar”, significa que as marcas irão atingir o que chamam de “estágio B” e não precisarão mais se expor tanto para ficarem conhecidas. Consequentemente, irão diminuir a oferta de dinheiro aos clubes através dos patrocínios, que deverão também ser em menor quantidade.
Fábio Wolff, sócio-diretor da Wolff Sports & Marketing, diz que o mercado, por conta das bets (apostas), tem vendido cotas de patrocínios por valores maiores do que os praticados normalmente. Inclusive, algumas empresas oferecem acordos a clubes que já são patrocinados por outras casas para retirarem da concorrente aquele espaço de exibição. Wolff também diz que pelo setor ainda não ser regulamentado, muitas empresas ainda não vieram para o Brasil e que, quando elas vierem, também vão querer investir em patrocínios.
“O segmento de apostas tem colocado muito dinheiro em patrocínios. São contratos com total disparate dos valores cobrados para outros segmentos, ou seja, o mercado está aquecido para as casas de apostas. E como o setor ainda não é regulamentado, os grandes players ainda não pisaram no Brasil. Quando tudo estiver definido, eles vão querer patrocinar”, disse.
O especialista também explica o que é o estágio B:
“Elas (empresas) precisam fazer a sua marca ser conhecida, no momento que isso for resolvido, começa o estágio B. Passam a focar em outros tipos de parcerias que resultem em ativações e não tanto a exposição da marca e patrocínios”.
Para Fernando Trevisan, especialista em gestão e marketing esportivo e diretor da Trevisan Escola de Negócios, não é saudável depender apenas de um único setor. E o futebol está excessivamente dependente das casas de apostas.
“Não é bom você depender tanto de um único setor. Pode haver uma crise setorial que vai impactar diretamente o seu negócio. É muito importante diversificar as fontes de receita. E o futebol brasileiro está excessivamente dependente de um único setor, que está em ebulição e que muita coisa ainda deve acontecer”, disse.
Trevisan também conta que a própria regulamentação do setor de apostas pode trazer algumas proibições para o mercado de patrocínios, a exemplo do que acontece em outros locais do mundo, por conta de questões de vício e saúde mental. Algo semelhante ao que acontece com os setores de bebidas e cigarros, que não podem ser vinculados a atividades esportivas.
“Se a gente olhar os mercados mais desenvolvidos, como será o nosso futuro, por exemplo o que aconteceu na Inglaterra, que acabou por banir que empresas de bet sejam patrocinadores masters. Eles podem ter acordos de patrocínio, mas não na frente da camisa, não como principal patrocinador.
Fonte: O Globo
Previsível
A projeção de queda nos valores dos patrocínios pagos por casas de apostas era uma possibilidade já vislumbrada por muitas pessoas, visto que até mesmo uma pessoa que não conhece profundamente o mercado esportivo consegue notar a criação de um modelo de negócio insustentável no longo prazo. Tudo bem que as casas de apostas ganham muito dinheiro em suas operações, mas com todas as novas atribuições e os custos adicionais que devem ser inseridos no processo de regulamentação do setor por parte do governo federal, uma reformulação nos valores disponibilizados por essas empresas para ações de marketing é naturalmente um caminho óbvio.
Agora, com os especialistas reforçando essa previsão, o mercado parece estar se conscientizando de que mudanças significativas podem ocorrer nos próximos anos. O atual crescimento acelerado do mercado de patrocínio esportivo por casas de apostas no Brasil tem sido benéfico para clubes e campeonatos. Diria que essa presença marcante das casas de apostas nas camisas dos clubes salvou diversos esportes de uma crise sem precedentes durante a pandemia de Covid-19. Sem o suporte fundamental do mercado de jogos, a realidade de muitas equipes poderia hoje ser catastrófica.
Contudo, a pandemia foi oficialmente superada pela humanidade, e o Brasil agora se prepara para regulamentar o setor de apostas esportivas. Com isso, a projeção dos especialistas consultados pelo jornal O Globo faz bastante sentido. O principal argumento trazido por eles é a possível consolidação das marcas no país, algo que deve ser alcançado em breve, visto que a agressividade das ações dessas empresas foi muito grande nos últimos anos, o suficiente para fazê-las nacionalmente bastante conhecidas. Para Fábio Wolff e Fernando Trevisan, à medida que as empresas atingem um certo nível de reconhecimento, elas não precisam se expor tanto para ganhar visibilidade, o que resulta em uma diminuição na oferta de dinheiro destinado aos clubes por meio de patrocínios.
Diante dessas reflexões, fica evidente que a queda nos valores de patrocínios pagos por casas de apostas é uma perspectiva previsível para o mercado brasileiro, considerando os fatores discutidos no texto. Agora, cabe aos clubes e ao mercado como um todo buscar estratégias para diversificar as suas fontes de receita e se adaptar às possíveis mudanças que possam ocorrer no cenário dos patrocínios esportivos nos próximos anos. Entretanto, conhecendo um pouco de como os clubes agem, eles não vão se preparar coisíssima nenhuma. O caminho mais provável é que eles deixem o problema surgir para só então buscar caminhos para resolvê-lo. Prevenção é uma palavra que não existe no vocabulário da bola brasileiro.
Escrito por Sérgio Ricardo Jr