Nota do IBJR mostra preocupação com mudanças na exploração da imagem dos clubes
O Instituto Brasileiro de Jogo Responsável (IBJR), formado pelos principais operadores de apostas esportivas do Brasil, publicou uma nota para comentar uma iniciativa política que busca modificar um artigo da Lei 13.756/2018. A mudança visa transferir a gestão das imagens, marcas e símbolos dos clubes esportivos do âmbito do Governo Federal para uma negociação direta entre casas de apostas e os clubes. Essa proposta, de acordo com o instituto, pode acarretar riscos significativos para os consumidores, o cenário esportivo nacional e o próprio governo.
Confira abaixo, na íntegra, a nota do IBJR:
A necessária arrecadação e repasse centralizado da contrapartida paga aos clubes pela utilização da sua imagem, marca e assemelhados
O artigo 30, § 1º-A, III, da Lei 13.756/2018 – com as alterações promovidas pela Medida Provisória 1.182/2023 – estabelece que 1,63% dos recursos arrecadados com as loterias de quota fixa devem ser destinados para as entidades do Sistema Nacional do Esporte, e aos atletas brasileiros ou vinculados a organizações de prática desportiva sediada no País, em contrapartida ao uso pelas casas de apostas de suas denominações, seus apelidos desportivos, suas imagens, suas marcas, seus emblemas, seus hinos, seus símbolos e similares.
Na sistemática acima descrita e proposta pela Lei 13.756/2018, a parcela dos recursos das apostas destinados a servir como contrapartida pelo uso da imagem e semelhantes, será arrecadado pelo Governo Federal de forma centralizada, que ficará responsável pelo repasse a cada clube e atleta o montante que lhes cabe, quando houver a anuência sobre a exploração de seus direitos.
O Instituto Brasileiro de Jogo Responsável, entretanto, tomou conhecimento de movimento que defende a supressão do disposto no artigo 30, § 1º-A, III, da Lei 13.756/2018, de modo que a negociação das imagens, marcas e símbolos dos clubes deixem de estar sob a gerência do Governo Federal e passem a ser objeto de negociação caso a caso, entre particulares, mais especificamente entre as casas de apostas e os clubes esportivos.
A mudança proposta é preocupante e pode ser altamente danosa para consumidores, o esporte nacional e o próprio governo pelos motivos expostos a seguir:
- Inviabilidade operacional: a arrecadação e repasse de forma centralizada proposta na legislação tem como objetivo viabilizar que todos os clubes interessados em autorizar o uso de imagem, nome e marca, possam fazê-lo e efetivamente receber uma contrapartida justa.
A proposta de suprimir essa regra, prevista na Lei 13.756/2018, inviabiliza em termos práticos a negociação de tais direitos. Para ilustrar a afirmação basta saber que hoje, no futebol brasileiro, entre as séries A, B, C e D, há 840 clubes. Isto mesmo, 840 clubes de futebol. O Governo Federal, conforme já declarado, espera com a regulamentação do mercado de apostas, contar com um número de 70 a 100 operadores licenciados.
Assim, se considerarmos conservadoramente a existência de 80 operadores no Brasil após a regulamentação e a existência de 840 clubes de futebol, para a exploração de direitos de imagem, símbolo, marca e assemelhados, poderão ser celebrados nada menos que 67.200 contratos apenas no futebol. Vale lembrar que as apostas de quota fixa recaem sobre diversas outras modalidades esportivas, como o basquete, o vôlei, o futsal, lutas, tênis e etc. Ou seja, frequentemente terão que ser celebrados centenas de milhares de contratos.
Os números são assustadores e, por si só, demonstram a inviabilidade prática da proposta de realização de negociações descentralizadas.
- Restrição de ofertas aos consumidores: a supressão do artigo 30, § 1º-A, III, da Lei 13.756/2018, também deve impactar drasticamente os consumidores, que verão seu direito de livre escolha restringido. Ao estabelecer negociações individuais haverá a possibilidade de um clube repassar seus direitos de imagem e assemelhados a um operador e não o repassar aos demais. Em termos práticos, isso pode gerar um monopólio. Somente uma determinada casa poderá oferecer apostas de um clube e as demais ficarão impedidas de o fazer, ainda que autorizadas pelo Governo para operar no mercado regulado.
Exemplificando. Se o Flamengo fechar acordo somente com o operador Alfa, apenas essa casa poderá oferecer apostas para jogos do Flamengo. Com isso, o consumidor que quiser apostar em jogos desse clube terá que fazer seu investimento no operador Alfa, ou não terá essa opção de entretenimento dentro do mercado regulado. Um eventual monopólio deverá gerar odds menos atraentes devido à falta de concorrência, prejudicando o consumidor que pagará mais caro pelo serviço prestado.
- Redução da taxa de canalização: um provável desdobramento decorrente de uma restrição de mercado promovida pela supressão do artigo 30, § 1º-A, III, da Lei 13.756/2018 e do desejo de um clube licenciar seus direitos a um ou a poucos operadores regulados, é que a baixa oferta no mercado de jogos de uma determinada equipe pode impulsionar os consumidores a procurarem empresas do mercado paralelo, que sem a fiscalização do Governo brasileiro, irão ignorar a vontade dos clubes nacionais de limitarem o uso dos seus direitos e oferecerão irrestritamente as opções de jogos.
Ou seja, ainda que o Flamengo deseje negociar seus direitos de imagem, símbolo e etc apenas ao operador Alfa no Brasil, outras casas de apostas sediadas no exterior seguirão oferecendo os jogos do Flamengo. Assim, em termos práticos, o apostador interessado no clube carioca vai apostar a partir do exterior caso não se interesse pela odd oferecida pelo operador Alfa. O efeito imediato dessa medida é um mercado paralelo maior (e um mercado regulado menor) com menos geração de recursos e empregos para o Brasil.
- Redução de patrocínios para os clubes: uma última decorrência da supressão do artigo 30, § 1º-A, III, da Lei 13.756/2018 e da restrição à utilização de direitos imagens e assemelhados dos clubes a um ou a poucos operadores, é que a impossibilidade de determinadas casas ofertarem em sua plataforma certos jogos irá gerar a redução de receitas e, consequentemente, o capital disponível para aportar nos clubes de futebol com patrocínios também será reduzido.
Como se observa dos quatro pontos expostos, a iniciativa de alguns interessados em tentar retirar da Lei 13.756/2018 o artigo 30, § 1º-A, III, decorre da mais completa incompreensão do funcionamento do mercado de apostas esportivas e ignora efeitos colaterais importantes dessa iniciativa que, acima de tudo, terá como principais prejudicados os consumidores, com a redução da oferta, os clubes esportivos, com a restrição de investimentos em publicidade, e o Governo brasileiro, com a baixa da arrecadação.
Em resumo, retirar do texto da Lei 13.758/2018 a proposta de centralização no Governo Federal a arrecadação e o repasse das receitas devidas aos clubes pelo uso da imagem, símbolos e assemelhados deve gerar efeitos colaterais indesejados:
(i) a inviabilidade prática de se negociar individualmente mais de 67.200 contratos apenas no futebol, sem computar os que teriam que ser firmado em outras modalidades esportivas;
(ii) o risco da limitação das ofertas de serviços oferecidos ao consumidor, pois a medida permitiria que um clube pudesse autorizar a exploração dos seus direitos por apenas um operador ou um grupo seleto deles, reduzindo a oferta de odds nas plataformas autorizadas;
(iii) essa restrição na oferta, consequentemente, gerará uma fuga de apostadores para plataformas estrangeiras, reduzindo a canalização, fortalecendo o mercado paralelo e reduzindo a arrecadação estatal; e
(iv) a fuga de apostadores para plataformas offshores, reduz a receita das plataformas licenciadas em território nacional e, inevitavelmente, faz com que elas reduzam custos, afetando diretamente suas despesas de marketing, o que diminui a oferta de capital para o patrocínio dos clubes de futebol no Brasil.
Toda ação gera uma reação. Retirar do texto da Lei 13.756/2018 o mecanismo de arrecadação e repasse centralizado de recursos das apostas esportivas vai prejudicar os consumidores, a regulação, o mercado e os próprios clubes. É preciso ter clareza de cada movimento para que depois não venhamos a nos arrepender da criação de um mercado inviável.
Instituto Brasileiro de Jogo Responsável
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